”Se você fosse sincera
Ô ô ô ô Aurora
Veja só que bom que era
Ô ô ô ô Aurora.”
Nos últimos dias o Brasil foi tomado pela mais popular festa do nosso povo. O rei momo vindo da mitologia grega, assumiu o comando dos súditos tupiniquins, incorporou à sua corte rainhas, princesas e milhões de foliões ávidos pela folia. Ele é o filho do sono e da noite, foi expulso do Olímpo, pois tinha como diversão ridicularizar as outras divindades. Momo é o rei do delírio e das fantasias. Entre seus súditos mais famosos está Arlequim, Colombina e Pierrô, saídos do século treze das ruelas de Paris, para o mundo. O Brasil deixa-se embrenhar pela fantasia, pelos ritmos do samba, do axé, do frevo, da marumba, dos tambores crioulos e de uma infinidade de ritmos e sons. São quatro dias de cachaça e de folia.
Passaram-se quatro dias, é hora de guardar as fantasias, deixar o rei Momo e sua corte nas lembranças de confetes e serpentinas. É hora de afastar os sonhos e devaneios amorosos de Arlequim e Colombina. É hora de reviver a dura realidade de um povo e de um país, que nos quatro últimos meses vêem seus empregos e sonhos se desfazerem como a alegria se desfaz na quarta feira de cinzas. A lembrança ainda persiste em ocupar a imaginação, aquele olhar, aquele encontro, aquele beijo, aquele abraço, aquela fantasia, aquele sorriso, aquele suspiro, aquele desejo, aquele gozo, aquele carnaval.
Mas pensando bem a vida é um carnaval. Fantasiamos e sonhamos todos os dias, por um país justo, igualitário, desenvolvido e soberano. Um país com reforma urbana, reforma agrária, educação pública de qualidade, saúde pública universal, emprego, segurança pública e social. Um país onde seus filhos tenham um futuro grandioso, onde seus jovens não sejam caçados nas periferias pelo tráfico. Um país que respeite seus trabalhadores e trabalhadoras, pela labuta do dia-a-dia e pelos compromissos históricos que sempre tiveram na construção da nação brasileira. Um país que respeite seus idosos, com cuidados que necessitam, previdência justa e universal. Um país que respeite seu povo acima de tudo e de todos, ao contrário do Rei Momo que ridiculariza a tudo e a todos para sobreviver na zombaria.
É com esse espírito carnavalesco que devemos no próximo período transformar este país num grande bloco político social. Construir a unidade em um país ainda dividido e fragmentado. Construir um bloco capaz de colocar milhões na rua em busca de um projeto político que mude radicalmente as estruturas econômicas e sociais adensadas pelo neoliberalismo. Precisamos pintar nossas fantasias, desenrolar nossas bandeiras, reforçar o grito dos pulmões, vestir nossas utopias, despertar os nossos sonhos e dar força e juventude aos nossos ideais. Precisamos urgentemente fazer frente aos blocos que já estão nas ruas de todas as cidades do Brasil.
O Bloco da crise – Depois de vinte anos soltos pelas ruas do planeta, zombando com o fim da história, vendendo uma vitória inacabada do capitalismo sobre socialismo. Depois de afirmarem que o neoliberalismo e o consenso de Washington resgatariam a paz e a igualdade entre os países e os povos. Depois de conclamarem os trabalhadores ao sacrifício, pois no futuro teríamos dias melhores com empregos e salários. O neoliberalismo fracassou como prevíamos. O que sobrou são Estados servis aos grandes banqueiros, as grandes indústrias, aos grandes latifundiários. O que vemos são trilhões de dólares saindo todos dias de Bancos Centrais de todo o mundo para salvar um capitalismo selvagem e cruel, um capitalismo bárbaro, sem futuro, um capitalismo falido pelas suas próprias leis.
O bloco dos desempregados – Nos últimos meses, todos os dias, em todos os países e continentes, constatamos atônitos, notícias em cima de notícias, anunciando novas demissões, o aumento continuo e diário do exercito dos desempregados. Na outra face da noticia são governos injetando diretamente nas empresas e bancos trilhões de dólares e as empresas, sem compromisso algum, passando o facão em milhares de empregos. No Brasil as empresas que mais lucraram nesta fase de crescimento internacional e nacional, foram as primeiras a passar o facão na cabeça dos trabalhadores. As exportadoras de commodites, setor automobilístico, setor agroindustrial, setor aeroespacial, são as campeãs em demissões. Não existe nenhuma justificativa que demonstre a necessidade destes setores em praticar de maneira selvagem suas políticas de ajustes para somente atender aos interesses de seus acionistas, em detrimento do país e dos trabalhadores.
O Bloco dos tucanos e Demos – Esta é a verdadeira turma do funil, todo mundo bebe mais ninguém dorme no ponto. Esses agrupamentos políticos foram os mentores diretos por colocar o país nesta rota do liberalismo irresponsável e selvagem. Foi esta turma que entregou todo o patrimônio público de mão beijada aos mercenários daqui e de fora. Foi esta turma do funil que abriu a economia brasileira e quebrou o país cinco vezes. Foi esta turma que desenvolveu a maior precarização nas relações de trabalho. Foi esta turma que praticou a maior ofensiva contra a previdência pública e os aposentados do país. Foi esta turma que bebeu na fonte da dívida pública bilhões de reais e não dormiu no ponto transformando Ministros de Estados e Presidentes de Banco Central do FHC em novos milionários. Estão de volta agora para dizer que o país precisa é de responsabilidade administrativa e reforma estruturais, o mesmo de sempre, porem com nova fantasia.
O Bloco da mídia – Estes sim são responsáveis pelos sons e imagens, que definem o ritmo das baterias, fundamentalmente contra os trabalhadores. São os responsáveis pela alegoria, sempre colocando os carros na frente do boi, transformando fatos jornalísticos em fatos políticos, para atacar, desmoralizar e pressionar as atuais forças políticas que governam o país. São responsáveis em passar o chapéu nas principais empresas e bancos do país, as mesmas que lucraram e continuam lucrando, mesmo com a situação latente. Fazem maravilhas pela telinha, colorem páginas das principais edições jornalísticas, produzem comerciais fantásticos envoltos de plumas e paetês. Estes senhores, que representam no máximo nove famílias possibilitam um carnaval de intrigas, de manobras, de mentiras, tudo para proteger a mais alta corte do liberalismo nacional. Para garantir seus lucros e seus interesses intocáveis.
Falta um bloco na rua – Nesse carnaval de crise, de hipocrisia e de mentiras precisamos organizar o nosso bloco. A ala dos trabalhadores que desfile com axé, pelo emprego, pelo salário, pelos direitos trabalhistas. A ala das mulheres, que exija respeito às diferenças nas batidas dos tambores do gênero humano, salários iguais por trabalho igual, que deixe de rebolar frente à tripla jornada e exija políticas públicas que garanta uma vida mais justa e solidária. A ala dos idosos que na sabedoria organizem as marchinhas para dar ritmo a uma nova ordem social e uma nova ordem previdenciária, onde os aposentados sejam respeitados pelo que construíram ao longo da sua jornada. A ala dos jovens, que transforme sua energia juvenil em energia de frevo, que remoce todos para o espírito da luta e da rebeldia, que resgate os milhões sem futuro e esperança. A ala dos sem terras que haverá de transformar a aquarela brasileira, que caminha do norte para o sul em imensos latifúndios, em um samba, com milhares de propriedades que acolha uma imensidão de homens e mulheres para sambar, sonhar e viver na terra. Que venha a ala dos cristãos, dos comunistas, dos socialistas, dos reformistas, dos nacionalistas, dos trotskistas, dos sindicalistas, de todas as tribos, de todas as fantasias e utopias. Que ao final este bloco transforme a avenida Brasil em um único enredo, com muitos ritmos para que todos tenham condições de apresentar de maneira mais sincera o desejo de construir um novo tempo, uma nova utopia um novo carnaval.
*Gilson Reis, Presidente do Sinpro Minas e da CTB Minas.
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