Maranhense também compôs o Hino de Libertação dos Escravos e foi primeira mulher a passar em um concurso público
Experimente pesquisar na internet o nome da escritora Maria Firmina dos Reis. O resultado mostra uma jovem branca com vestimentas nobres. Mas, a imagem é bem diferente da verdadeira fisionomia da primeira romancista negra do Brasil.
“Rosto arredondado, cabelo crespo, grisalho, fino, curto e amarrado na altura da nuca. Olhos castanhos escuros, nariz curto e grosso, lábios finos, mãos e pés pequenos. A Firmina era uma escritora negra, do século XIX. Então, porque a representação imagética dela é de uma escritora branca?”, questiona o pesquisador de literatura abolicionista Rafael Balseiro Zin. A situação, segundo ele, evidencia o esquecimento da vida e obra da maranhense.
“Mesquinho e humilde é este livro que vos apresento, leitor. Sei que passará entre o indiferentismo glacial de uns e o riso mofador de outros, e ainda assim dou à lume. (…) Sei que pouco vale esse romance, porque escrito por uma mulher, e mulher brasileira, de educação acanhada e sem trato e a conversação dos homens ilustrados”.
Foi com essas palavras que Firmina apresentou seu primeiro romance “Úrsula”, em 1859, assinado com o pseudônimo “Uma Maranhense”. As palavras que revelam a lucidez da escritora sobre sua condição social enquanto mulher e negra no século 19 ficaram registradas no prefácio do livro. A obra foi esquecida por muitos anos no porão de uma biblioteca pública do Maranhão.
Em vida não foi reconhecida como escritora. Passados cem anos de sua morte, completados em 2017, o nome de Maria Firmina ainda habita os porões da memória brasileira.
“Ela denuncia as mazelas da escravidão, ela denuncia o lugar destinado ao negro e à mulher, naquele contexto social do Brasil do século XIX e por isso, ela tem uma importância absurda. Mas, infelizmente, ela continua desconhecida pela grande maioria do público e a intenção, lembrando que em 2017 a gente rememora o centenário de morte dela, é aproveitar a data comemorativa para poder divulgar ao máximo o nome da Firmina e fazer com que ela passe a ocupar os cursos de literatura, ou mesmo as cadeiras de instrução primárias, do ensino fundamental e médio, do Brasil”, defende Balseiro Zin.
Além do romance “Úrsula”, a escritora publicou os contos “Gupeva”, em 1861; “A Escrava”, em 1887 e um livro de poesias em 1871, intitulado “Cantos à beira-mar”, todos na perspectiva antiescravista. Outros aspectos da vida de Firmina fez com que ela fosse considerada pioneira. Ela foi a primeira mulher a criar uma escola mista em 1881, onde meninas e meninos estudavam juntos.
“Ela foi a primeira mulher a passar num concurso público para a cadeira de instrução primária, no município de Guimarães, interior do Maranhão”, conta o pesquisador.
Maria Firmina também compôs o “Hino de Libertação dos Escravos” em 1888.
“Além disso, ela tinha uma preocupação muito grande em reunir cânticos populares, ligados às cantigas de boi, bumba-meu-boi, boi-bumbá, que estão muito fortes dentro da cultura popular maranhense”, destaca.
Firmina carregou o estigma de mulata e bastarda por ser filha ilegítima de mãe portuguesa e pai negro, provavelmente um escravo africano, como afirmam pesquisadores. Além das obras, ela nos deixa a oportunidade de rever a história e a memória social, desta vez com Maria Firmina dos Reis como a primeira escritora negra do Brasil.
Fonte: Brasil de Fato
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