“A austeridade compromete o futuro das próximas gerações, aumenta a desigualdade social e destitui direitos dos cidadãos”, diz trecho do documento Austeridade e retrocesso – impactos sociais da política fiscal no Brasil, divulgado terça-feira (7) na Comissão de Direitos Humanos do Senado. Resultado de meses de debates sobre temas diversos, o relatório afirma que abrir mão de políticas de transferência de renda “é optar por uma sociedade cada vez mais desigual e segregada, destituindo o acesso da população a direitos sociais básicos”. Confira aqui a íntegra do documento.
A situação se agrava com a aprovação da Emenda Constitucional 95, de congelamento de gastos públicos por 20 anos. Uma “regressão social” que pode fazer o gasto passar de 19,8% do Produto Interno Bruto (PIB), em 2017, para 12,4% em 2037.
Segundo os autores do documento, a EC 95 (que começou a tramitar em 2016, como PEC 241) é “um projeto de Estado mínimo no Brasil, absolutamente incompatível com a garantia de direitos sociais e com a Constituição Federal de 1988”. Um projeto “especialmente grave para o caso brasileiro, no qual o orçamento social é uma ferramenta fundamental de redução da já escandalosa desigualdade social brasileira em todas as comparações internacionais”. Em resumo, “um passo à frente no ‘abismo social'”.
“O arrocho fiscal imposto pelas políticas de austeridade econômica tem promovido o desmonte de políticas públicas e permitido uma nova agenda do governo, com aumento da influência privada nas decisões estatais e um redirecionamento dos esforços do Estado”, diz o documento. “Essa nova postura de política fiscal cumpre a perversa função de reverter os avanços conquistados nas últimas décadas no acesso a bens públicos e na redução da pobreza, assim como a melhora recente no mercado de trabalho e o aumento do poder de barganha dos trabalhadores.”
No caso da saúde, por exemplo, políticas de austeridade tendem a piorar o quadro, na medida em que cortam recursos do sistema e reduzem a proteção social. “O resultado é, por exemplo, o aumento da mortalidade infantil, que voltou a crescer em 2017 depois de 26 anos de queda”, diz o texto. A EC 95 acaba com as perspectivas de melhora da saúde pública. De acordo com simulação que integra o relatório, os recursos federais destinados ao Sistema Único de Saúde (SUS), até 2036, cairão de 1,7% para 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB). E despesas do Ministério da Saúde transferidas a estados, municípios e Distrito Federal cairão em dois terços.
No caso da educação, a emenda “inviabiliza definitivamente o Plano Nacional de Educação”, afirma o documento. “E vai contra a última recomendação do Comitê das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (CRC) ao Brasil (feita em 2015), que enfatizou a necessidade de ‘garantir os recursos para a implementação do PNE, mesmo em tempos de crise’.”
Com quase 30 colaboradores, o documento foi coordenado pelos economistas Esther Dweck (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Ana Luíza Matos de Oliveira (Universidade Federal de Minas Gerais) e Pedro Rossi (Universidade Estadual de Campinas). Além de saúde e educação, trata de áreas como seguridade social, meio ambiente, cultura, segurança, moradia, agricultura familiar, reforma agrária, gênero, raça e direitos humanos.
Eles argumentam que a EC 95 “é um projeto de desconstrução do pacto social de 1988 naquilo que ele tem de melhor: a cidadania social”, além de um “equívoco macroeconômico”. E receitam justamente o caminho oposto.
“O desenvolvimento brasileiro deve passar pela redução das desigualdades e pela ampliação do acesso aos bens e serviços públicos em contexto de aprofundamento democrático”, afirmam os autores do documento. “Nesse projeto, a ampliação do gasto social é fundamental como ferramenta de desenvolvimento e para aumentar o impacto redistributivo da politica fiscal. Em um país tão desigual como o Brasil, a garantia de recursos do orçamento público para atender as demandas sociais é fundamental para viabilizar o exercício de direitos e da própria cidadania social.”
Longe de ser uma “necessidade técnica”, afirmam, a austeridade é uma “opção política-ideológica”.
Fonte: Rede Brasil Atual
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